"Uma a uma, as pétalas vão caindo."
"Uma a uma, tu as apanhas e colocas de volta, onde pertencem."
"Naquele ciclo inesgotável onde reside apenas a minha mórbida silhueta e a tua neurótica paciência. Preso à minha decadência, ocupando a mente com aquele trabalho interminável de manter de pé a memória que reside solitária na minha lápide. Dás-lhe a beber a saliva, a infinita atenção das palavras, o folgo ofegante da tua existência."
Mas elas teimam em cair, enquanto tu teimas em ampará-las, adivinhando-as mesmo antes de tocarem a pedra fria e sem vida que agora marca a minha passagem neste mundo. Chegas à milésima tentativa de me manteres na mente, mas à medida que apercebes que "Nunca é Tarde de Mais" é uma singela mentira para apaziguar os homens, o punhal crava mais fundo, dentro da alma.
"Senti-te abrir-te, aos poucos. Até que já não abria mais."
Também eu te sinto agora. Enquanto a vida cai, abrindo caminho à loucura.
Estão as pétalas machucadas do sempre erguer artificial, já te esta cravado. E o sangue que cai, sem dares conta, na minha pele agora fria de pedra. É transparente, cristalino, salgado. Da cor do evanescer.
Mas agora, algo muda. Sem dares conta, as memórias cessam de cair. Mas mantens ainda as mãos em concha, prontas a queda da mais pequena peça de mim. Apenas se enchem de sangue, do mesmo que a pedra agora quente absorvera.
Sem dares conta, que a memória persiste baixinho, escondida nos recantos daquela flor que amavas e agora se ergue. Mas a alma vazia, esgotada por salvar, cuidar, já não pode ver, já não pode recordar, toda a atenção contida no acto de espera e recolha da queda habitual. Para que viva.
Sem dar conta que esta não morre.
"Talvez não lhe fosse suficiente"
Quê da memória que não pode ser recordada e da recordação sem memória?