segunda-feira, 19 de novembro de 2007

Eleanor


"Há muito tempo, ecoavam os risos pelas ruas, os passos pelas estradas de pedra... Quando ainda se adivinhava uma voz alegre que entraria pela janela aberta. As escadas tamboreavam com os passos apressados, e logo as ruas ficavam vazias e rebentavam pela costura quando os olhos se tocavam nas almas e os dedos cruzavam no peito, quando passava a porta sempre aberta.

Mas a porta está agora trancada. Fechára-a a primeira vez quando lhe disse "até já" e viu o mundo fugir, quando chegou a guerra. Abrira-a uma ultima vez para olhar os olhos de um soldado moribundo. Não foram precisas condolências. Para que abrisse a janela para sempre, assumasse e bradasse aos céus, gritasse aos ventos, amaldiçoasse os anjos, maldissesse os tempos, cuspisse no mundo e jurasse vingança.
Vingança.
As Bruxas do Mundo trancaram-lhe a porta de si mesma, o Tempo quebrou-se, em unanimidade com as Quatro Estações que fugiram da sua vida. O Dia e a Noite fundiram-se, não havendo luz ou escuridão, só sombra. Os Sonhos pintaram-se de negro originando em pesadelos, de tal forma que não poderia dormir. As Memórias essas decidiram permanecer alimentando uma esperança morta e a Morte, essa cortou-lhe o fio da vida, sem num entando o deixar quebrar-se. E assim o Destino traçou-se."
A janela continua aberta. Mas dela só chega vazio. Não chegam vozes ou sons, nem o cheiro a castanhas ou a chuva que tropeça na calçada. Dela não chega nada. Não chegam flores essas já estão murchas, na jarra de vidro tombada, não a paz, roubada há muito tempo pela guerra.
Da janela só sai a vida, o ar que expira a pouco e pouco fazendo mover o pó do chao em que está caída.
Pela janela escancarada foge a esperança.
Pervalece um silvo, uma pequena vibração dos risos de há muito tempo.
A pele nua, cor de lua, sobre o chão, talvez frio se o senti-se, cabelos quase indistinguíveis sob as teias de aranha, os olhos vidrados e bem abertos, tornados pretos pela ausencia de cor ou falta de luz. Estes nada vêem realmente, tal como a pele nada sente. Estes revêem vezes e vezes sem conta (da conta do tempo), imagens de memórias. Memórias de abraços, beijos, de conversas, de vozes, de uns olhos que amára, de uma presença impossível de sentir, de um corpo que sentira no seu. De risos que ecoavam.

"Há muito tempo, havia uma janela aberta, por onde nada entrava e nada saía. Uma janela aberta que haverá sempre."

14 comentários:

Anónimo disse...

Sem fôlego...! A nostalgia, de um tempo que já não é, exauriu-me o ar que em mim havia, qual janela por onde a vida se escoa, para não mais renascer...!
Lindíssimo, o teu texto!
Nem sei o que mais dizer...

Um beijo... :-)

Pekenina disse...

Simplesmentee stonteante. Mas acarreta tanta tristeza. Dessa janela aberta o sol aparagará as sombras, um dia. Um dia... mas virá! Por mais que a esperança se queira apagar, essa porta que se fechou permitiu abrir a janela. Mesmo no vazio dos sons a esperança existe nos olhos que nada vêem. "Basta" acreditar ;)
Beijinho,
Pekenina*

Rute disse...

Brilhante.
Sinto o peito apertado, nem sei bem porque.

Sabes, deixar a janela aberta nbão é de todo mau. Por vezes entra ar que tira o cheiro a mofo dos quartos fechados, e o sol vai iluminar tudo.

Ana Guedes disse...

senti, neste excerto, o tempo como um vento cortante. um arrepio que vibra nas cordas do coração.

adorei!

Only me disse...

A janela faz bem estar sempre aberta...para se ouvir os sons que fora de-la vêem...

A esperança...entrar


Beijokas

Julieta disse...

Por uma simples janela entram sempre e quando mais precisamos os raios mais intensos do "Sol" da vida.

Beijinhos carinhosos

Mary disse...

Texto maravilhoso. Na minha opinião devemos sempre deixar uma janela aberta, nunca se sabe o que poderá entrar por ela, talvés paz, harmonia ou simplesmente um sorriso.

Bichinho disse...

Fantastico...beijo fantasma.

Bichinho disse...

Fantastico...beijo fantasma.

Refúgios disse...

Lindo... Essa janela aberta é a essperança que não quer ter... Bjinhos

eudesaltosaltos disse...

eu, as janelas e as portas temos uma relaçao amor/ódio. costumo dizer, fecham-se portas abrem-se janelas, mas isto é bonito de s dzr, mas d realmente ver as janelas qd precisamos... bj pa ti

carteiro disse...

As tuas palavras dizem o frio, sentem e fazem sentir o frio mas num sentimento de existência de calor, lá ao longe. E para lá do frio, solidão.
Eleanor será um nome que vou associar sempre à solidão... pela canção dos Beatles, que não sei se gostas, conheces ou pensaste para o título destas palavras..

Rute disse...

Hora da mensagem!!!!

- Tens uma prendinha no meu blog!!!

Anónimo disse...

perfeito, tal como tu. passas todos os limites com a tua escrita.Vai ser bom deixar a janela aberta, traz sempre novas oportunidades de vida.