domingo, 28 de outubro de 2007

Carmen


Todos a comentavam, calados. O balanço da sua força e harmonia, compassados pelo ritmo brusco, alto, que a guiava. A imponência dos seus gestos, a altivez da sua alma, o gozo, quase desprezo nos seus olhos, a sedução dos contornos do seu corpo, naquela dança desenfreada, repetitiva, louca, que funcionava como feitiço para a essência masculina. Mesmo as senhoras, as damas que a reprovavam, repugnadas diziam, sentiam relutância em desviar o olhar.

A fuga corrida das cordas da guitarra, a voz sofrida que a acompanhada, embalavam-na, tornando-a prisioneira da personagem que representava.

As mãos ganhavam vida própria, as castanholas não era ela que as tocava, os pés que batiam no chão com uma força surpreendente, a saia que puxava e rodava com desenvoltura e que os olhos mais atrevidos procuravam transpor. Os cabelos negros molhados de suor, a roupa de suor se lhe colava, numa beleza perversa que nem os mais timidos conceguiam evitar. Os olhos sombrios que, uma a uma, regeitavam, humilhavam as vozes masculas sumidas. Vozes que pontapeava com o olhar, tornando-a proibida, intocável. Às superiores senhoras, um relance e riso discreto, de gozo e superioridade.

"É a mulher do diabo" comentavam, sempre caldas, umas com as outras, não fosse o próprio ouvir.
"É bruxa. Que arda nas chamas do Inferno!" e benziam-se de mão fechada.

E ela gargalhava de lábios cerrados, que arder já ela ardia, rodopiando cada vez mais rápido, a guitarra que fugia mais e mais tentando acompanhá-la, a voz que padecia de um quase tormento e ela embalada, alucinadada, embalando e hipnotizando as suas presas, para as garras do diabo, naquele ritual incessável e macabro que era ela.

8 comentários:

Mary disse...

Gostei do texto .. Carmen! =D
Concordo contigo quando dizes que vivemos para criar memòrias. So' gostava era que algumas memòrias fossem eternas; que pudessem ser revividas outras vezes =S Beijinho

Marina disse...

:)
amei o texto

gostava d voltar atrás no tempo, há altura em que essas mulheres que se destacavam era ditas bruxas e demoniacas, gostava d m sentir assim nessa altura
temida, invejada, simplesmente perfeita no meio de tanta imperfeição julgada perfeita

***

Mary disse...

Sinceramente nao eu sei te responder ao certo, mas parece que sempre que as coisas estao bem acontece sempre alguma coisa que muda tudo ou ha mal entendidos e nem eu nem ele os resolvemos, depois veem as discussoes (nao com gritos mas as vezes era preferivel) ditas com palavras que as vezes magoam muito mais e nao sao o qe realmente sentimos..a serio eu gosto mesmo dele so' que acho que o melhor mesmo era esqece'lo so' que e' tao dificil conseguir-se esquecer o vizinho da frente! bah!

Maria Jakina disse...

Belo o seu texto
Carmen ditosa e bela

Desejo uma boa noite

Refúgios disse...

Lindo! E é com orgulho que se é uma “Carmen” Bjinhos

Luis Ferreira disse...

Vim conhecer o teu mundo e amei o texto.

Parabens

Dhyana disse...

Genial! Quase que dançava, até tinha os pés em compasso. Adoro a dança e descrita assim, foi um prazer ler.
Beijos...

Mary disse...

Boa pergunta .. sinceramente não sei! às vezes desejava mesmo esquece-lo mas outras vezes parece que ha algo que me diz para nao o fazer, para nao esquecer que foram dois anos a gostar da mesma pessoa, que nunca amei ninguem como o amo a ele e "deitar fora" tudo o que ja' vivemos e tudo o que ficou por viver! custa ..=S